MULHERES/MONTRAS
Continuo espantada com a quantidade mirabolante de ideias muito interessantes que podem passar pela cabeça de uma pessoa às horas mais estranhas. Mais uma vez tinha-me eu esquecido dos horários dos autocarros da madrugada, e mais uma vez a tininha mostrou a sua infinita compaixão por pessoas como eu, despassaradas e esquecidas, esperando comigo uma hora ao frio pelo meu querido 19. Isto, bem entendido, eram 4h da manhã, e por ali ficámos até às 5. Ao menos não estava a chover.
Foi nesse momento que, ao repararmos na quantidade absurda de carros que abrandava ao passar por nós na avenida dos aliados, a tininha formou o seu iluminado enunciado sobre mulheres e montras, homens e mulheres.
Toda a gente sabe que uma mulher lambe montras. É um dos seus passatempos preferidos, inútil, no qual gasta muito do seu tempo útil, especialmente se tiver entre 15 e 40 anos. Algumas praticam este desporto até muito tarde na vida. Uma mulher olha para todo o género de montras, desde sapatos ("AHHH!!! que lindos, dava tudo para ter aqueles prada!!"), especiarias ("realmente nunca provei caril de antígua mas ainda no outro dia estava a pensar fazer uma daquelas receitas do pantagruel, visto nunca o ter aberto"), facas ("ainda bem que ainda não tenho casa e ainda não tenho de pensar em comprar isto"), a serviços ("que horror! parece aquele trem de cozinha da filipa vacondeus! jamais comprarei uma coisa como esta").
Ora o facto interessante é a comparação que a tininha fez: o homem sofre exactamente da mesma doença do olhar, no entanto, o objecto não são montras, mas mulheres. Todas as mulheres. Quaisquer mulheres. E sempre acompanhado, como acontece com as mulheres e as montras, de uma observação, nem que seja apenas no pensamento. Eles não conseguem deixar de olhar, mesmo que estejam agarrados à namorada, à mulher, aos filhos, nem que a mulher em questão seja gorda, alta, magra, baixa, feia ou bonita. O mesmo acontece com as mulheres, que não conseguem deixar de olhar para as montras, nem que estas sejam bonitas, feias, grandes, pequenas, cheias de objectos inúteis ou úteis, de lojas de mobiliário de casa de banho e lojas de trezentos. É impossível escapar-lhe. É mais forte que nós.